Terreiro de Umbanda Vovó Catarina

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terça-feira, 20 de março de 2012

 


A casa do Barão

-Não chore!”Dizia Preta Zica,ao escravo João preso pelo capataz por ter sido pego tomando o leite que acabara de ser tirado da vaca que pertencia ao Barão..
João havia sido preso a um elo de aço,entre tantos outros negros escravos que ficavam sob a Casa do Barão de Águas Claras.
A maioria dos casarões da Corte Imperial situados a Rua Koeler ,eram de pessoas da Alta sociedade e amigos de D.Pedro II,esses,trancafiavam seus escravos,sob os imponentes casarões,sendo por um alçapão,a única forma de se chegar até a “Senzala improvisada” que ficava sob o assoalho das casas dos Senhores de Escravos,não havendo assim,possibilidade de fuga.
-Um dia,eu hei de me vingar,e colocar esses brancos malditos,presos aqui,onde me encontro hoje!!Nesse dia,eles sentirão na pele e pagarão seitil por seitil o que fazem com todos nós!Dizia o escravo João,inconformado por ter sido preso tentando saciar a sua fome.
-Fio,não devemos ter sentimentos de ódio...que seja feita a vontade do Senhor...tenhamos fé!Dizia Preta Zica.
O inverno rigoroso da Cidade Imperial,fazia com que muitos negros,que se encontravam presos pelas mais variadas formas pelo capataz do Barão,acabassem por adoecer,outras vezes até morrer devido as condições precárias de vida a que eram impostos,padecendo de males como a pneumonia..
Em uma noite de chuva ,o Barão precisou que seu capataz se ausentasse do Casarão a fim de levar uma encomenda urgente a 20 quilômetros dali,ficando assim,sozinho na casa.
Decorridos,algumas horas,ele ouvira ruídos,murmurinhos e risadas que vinham da parte inferior da casa,e,vendo que se tratava dos escravos,desceu até a “senzala” pra calar a boca dos escravos insolentes.Mas,chegando a parte debaixo,ele fora surpreendido por outros negros que o pegaram e rapidamente o colocaram preso ao lado do escravo João que ria da situação.
-Seus insolentes!Quando o capataz voltar,vocês pagarão com a vida!!
E,antes que o Barão tivesse tempo de dizer outra frase,eles pegaram um copo de vinho com veneno e fizeram o Barão beber,vindo este a falecer em questão de minutos.
Nem todos os escravos que ali estavam,conseguiram fugir,pois os mais debilitados sabiam que não conseguiram ir longe,então decidiram por ficar e sorver da bebida letal,pois eles sabiam que não sobreviveriam quando o capataz retornasse ao Casarão.
Passados muitos invernos desde aquela triste noite ,e chegando nos dias atuais,veremos Pai Carlos,renomado Pai de Santo do Terreiro Luz Divina e mais doze médiuns,indo até um Casarão para fazer uma limpeza espiritual ,a pedido de um casal atemorizado por espíritos em sua residência.
-Muito bem!Todos estão prontos para o início dos trabalhos?
-Espere!Que barulhos são esses  vindos do assoalho da casa?Perguntou Antônio ao Casal que de pronto respondeu:
-Isso é pouco!Acho,que deveriam ir lá embaixo onde era a “zenzala”,antes de começarem qualquer coisa.
Ao que Pai Carlos autorizou,Antônio,um dos médiuns mais antigos,desceu juntamente com outros dois médiuns para tentar descobrir o que se passava lá embaixo.
Antônio,nunca sentira vibração como aquela,o chão de terra batida,mostrava traços de escravidão,com correntes enferrujadas,algumas poucas presas ainda a parede,e,em um canto uma coisa parecida com uma gaiola onde provavelmente ficavam os escravos quando eram castigados pelos seus senhores.
Vinham a mente de Antônio,perturbações de diversas formas,escravos sendo açoitados e presos nas gaiolas até padecerem,mulheres negras pedindo água,muito choro,palavras de ódio,pedidos de vingança,visões distorcidas que o fez pedir ajuda de Pai Carlos..
Pai Carlos desceu até Antônio e depois de uma prece,ao que Antônio se sentiu melhor,Pai Carlos começos os trabalhos daquela noite ali mesmo sob os olhos surpresos de todos.
O Preto-Velho de Antônio,foi para a parte superior da casa,afim de acender 7 velas em um local específico para o bom andamento dos trabalhos,e,ao que acendeu a última vela,veio uma ventania que apagou todas as velas ao mesmo tempo.
O Preto-Velho olhou para frente e avistou um homem de meia idade,branco,e que parecia xingar alguém  andando rápido como se estivesse a procura de algo ou alguém,sem nem perceber o Preto-Velho que ali estava...
-É......sussurrou o Preto-Velho...
Voltando a parte debaixo do casarão,os Pretos-Velhos que estavam fazendo a limpeza da Casa,terminaram seus trabalhos,e,o Preto-Velho de comando,disse aos médiuns que mantivessem os pensamentos elevados,pois havia escravos ali que,por terem tirado a própria vida antes da hora,ainda se encontravam presos naquele lugar e mais ainda, o espírito de um Senhor que parecia ser o dono da casa que não aceitava a situação em que se encontrava,vagava e precisava de muita oração,pois ele acreditava que se deixasse a casa,os escravos tomariam o lugar que era dele.E assim se passou uma longa noite de trabalhos espirituais a fim de findar ou pelo menos amenizar a situação em que se encontrava o casarão.
Mesmo com a ajuda de treze médiuns naquela noite na Casa do Barão,os Donos decidiram por vender a propriedade para uma rede de hotéis,pois ficaram impressionados com tudo o que passaram desde o primeiro dia que pra lá se mudaram.O casarão passou por reformas e  hoje recebe  turistas de todo canto do País e do Mundo.
....vocês devem estar se perguntando:E quanto ao Barão?A zenzala ??Os escravos??
Bem,dizem os empregados que lá trabalham,que às vezes ouvem murmúrios que parecem vir da parte debaixo da casa  e passos largos no cômodo onde dormia o Barão de Águas Claras.....
Fernanda Mesquita

sexta-feira, 2 de março de 2012

Caminhos diferentes


Um Conto De Fernanda Mesquita


-Não consigo caminhar mais...minhas pernas estão dormentes-Gemia Nega Maria enquanto Véio Felício tentava sem sucesso puxar pelos braços a escrava fugida.
-Estamos perto do Quilombo...falta pouco-Dizia Nêgo Felício que,tentava animar aquela senhora de traços cansados e visivelmente abatida.
Ainda faltavam algumas horas até chegar ao Quilombo,o caminho era de difícil acesso,com atalhos falsos para confundir os empregados das fazendas que eram encarregados de caçar os escravos fujões no meio das matas.
Com um certo esforço...a velha se levantou,e com a ajuda de Felício se puseram a caminhar novamente,mas,sabiam que não podiam ir devagar demais porque o capataz da fazenda poderia estar no encalço dos 7 negros que conseguiram fugir da fazenda Sesmaria naquela madrugada..O que eles não se deram conta é que, devido a parada da Nega Véia os dois ficaram pra trás,e,com isso poderiam errar o caminho para se chegar ao Quilombo...
No fim do dia,cansados,pararam na beira de um riacho para se refrescarem e encontraram um jovem escravo que estava muito assustado e,muito machucado...talvez por chibatadas,pois das marcas das costas dele saía um odor fétido e pruridos amarelados um sinal claro de infecção,e,com todo aquele sol batendo nas costas do negro,só fizeram piorar a situação dele...
-Fujam!-Dizia o jovem.
-Eles estão chegando e não demoram!
-Eles quem meu fio?Perguntava Felício já assustado com a resposta que ele já sabia.
-Tem um capataz à cavalo com alguns empregados da fazenda Sesmaria,procurando por escravos que fugiram da fazenda esta madrugada...e agora eu, que já estava no caminho do Quilombo, tive que recuar e esperar que eles voltem para não acharem o caminho de lá!
-É meu Nego..dizia Maria..eu não agüentarei correr,acho melhor ficar e esperar que me peguem,vão vocês e me deixem aqui.
-Não!-Disse Felício  em tom firme.Não te abandonarei aqui pra que esses imundos a peguem e a açoitem!Porque você sabe que não irão matá-la de pronto! Farão você sofrer no tronco, até que agonize..como fizeram com minha irmã querida..a deixarão no tronco debaixo do sol escaldante sem água,com as chagas abertas e agonizante até o fim derradeiro.Não desejo que aconteça o mesmo com você!
O jovem vendo a tristeza estampada no rosto de ambos, teve uma idéia.
-Vamos até as pedras do outro lado do riacho, lá tem uma gruta, é pequena mais cabem vocês dois! Fiquem quietos lá até a noite chegar, vou mostrar pra vocês o caminho certo pro Quilombo, distrairei o capataz pro outro lado da mata, sou jovem,astuto corro bem,mas não saiam até a lua estar alta,ok?Sigam o caminho e andem o mais rápido que puderem, depois eu vou atrás de vocês..chegarei em seguida.
E  assim fizeram os  velhos escravos,cansados,com fome...não tinham outra alternativa senão concordar com o jovem que parecia tão certo de si.Se despediram e o jovem disse ao Nego Felício:
-Se por acaso eu não chegar, procure por Pai Antero e diga que Eu Antônio,consegui o meu intento que era,só retornar ao Quilombo depois de  dar cabo a vida do Escravo delator,que tirou a vida de sua filha mais nova.Que se Eu morrer ou for pego,não me importo mais,cumpri o que prometi a ele e a mim!
Véia Maria, chorando muito o abraçou e disse: Que Nosso Pai Maior te acompanhe meu fio!
Passado alguns minutos, os velhos ouviram o capataz gritando:
-Olhem!Lá vai o escravo fujão! Peguem ele!
O Jovem Antônio corria velozmente, muito astuto, conseguiu correr bem, mas, o seu erro foi achar a linha férrea e tentar seguir por ela pra não se perder..Do outro lado da linha vinha o  capataz de outra fazenda juntamente com seu Senhor,e,avistando o negro,correram à pé atrás dele,pois viram que o negro havia entrado em uma cabana de grãos para tentar se esconder.
Antônio se escondeu dentro de um saco de grão não muito cheio que ficava atrás dos sacos maiores da frente e ficou imóvel olhando entre os furos do saco o capataz retirar um facão e sair furando saco por saco à procura do escravo fujão.
Subitamente, o capataz parou em frente ao saco que estava na frente do negro , este, já sabendo de seu fim derradeiro fechou os olhos e esperou...
Com um só golpe, o capataz enfiou o facão no saco de grãos , acertando em cheio o peito do Jovem negro ,que nem teve tempo de se defender..seu sangue se misturava aos grãos de milho e assim terminava a saga do Jovem escravo  Antônio que,morrera sabendo que sua missão havia sido cumprida.
Quanto a Maria e Felício, bem, esses, chegaram ao Quilombo ao amanhecer  e foram recebidos por Pai Antero que sentira uma tristeza profunda depois que Felício dera o recado...ele sentia que Antonio  companheiro  de sua falecida filha querida ,não voltaria mais...Antero o tinha como um filho querido.
Pai Antero pegou o pequeno neto no colo, o beijou na fronte e sussurrou:
-Seu Pai e sua Mãe agora estão juntos e olham por nós agora. Cuidarei de você até o fim de meus dias..
Fernanda Mesquita